Na última semana, o discurso de posse do presidente Donald Trump não surpreendeu a muitos, mas deixou um sentimento de apreensão. O que mais chocou foi a ausência de subterfúgios negacionistas em sua fala. Em vez de negar a crise climática ou questionar os direitos de grupos minoritários, Trump proclamou abertamente suas intenções de avançar rapidamente com seu programa de governo. Essa postura direta e desafiadora reflete sua estratégia de mobilizar seus apoiadores em torno de uma visão de mundo que se opõe a tudo o que considera uma ameaça à nação americana.
O discurso não se dirigiu a inimigos específicos, mas sim a um espectro amplo de adversários, exceto à nação americana, que ele promete revitalizar. Durante a transmissão, a imagem de um líder político, um homem septuagenário, se destacou. Sua prepotência e vulnerabilidade coexistem, criando uma figura complexa. O tom beligerante de sua fala evocou imagens da Guerra Fria, mais do que as preocupações contemporâneas de um governante. Essa recuperação de um passado militarizado sugere uma visão de mundo que se recusa a aceitar a realidade atual.
Trump parece tentar convencer a todos de que a realidade não é o que parece. Ele se apresenta como um símbolo de vitalidade e masculinidade, enquanto o mundo que ele idealiza é aquele do passado, marcado pelo industrialismo e pelo consumo desenfreado. Essa retórica sugere um desejo de retornar a um tempo em que a masculinidade e o poder eram indiscutíveis. O discurso de posse, portanto, não é apenas uma declaração de intenções, mas um chamado a um novo destino manifesto que ressoa com seus apoiadores.
Entretanto, é importante questionar para quem exatamente Trump estava falando. Suas palavras não se dirigem a todos, especialmente aqueles que estão mais ao sul. O grande líder não se preocupa em se conectar com aqueles que não compartilham de sua visão. Ele fala para seu eleitorado, mobilizando-os em torno de um sentimento de pertencimento a algo maior. Mesmo que seus apoiadores reconheçam a falta de substância em suas afirmações, eles se orgulham da capacidade de seu líder de expressar essas ideias sem pudor.
Essa é, de fato, a política do fim do mundo, onde o ódio se torna uma força mobilizadora. Os apoiadores de Trump se unem em torno de uma série de ódios: contra os pobres, a esquerda, os feminismos, os imigrantes e as políticas assistenciais. Essa mobilização emocional permite que o presidente promova medidas cada vez mais autoritárias, colocando em risco os pilares da democracia. O discurso de Trump não é apenas uma retórica vazia; é uma estratégia deliberada para desmantelar a empatia e promover a divisão.
A vitória eleitoral de Trump não é apenas resultado de uma crise econômica, mas também de uma linguagem moralista que retrocede na história. Essa retórica apela a um público que se sente ameaçado pela diversidade e pela mudança. O discurso de Trump fisga a emoção de cidadãos que se sentem desfavorecidos pela globalização e pelo multiculturalismo. Essa conexão emocional é poderosa e permite que ele mantenha seu apoio, mesmo diante de críticas.
As pessoas estão abertas a esse discurso porque Trump captura suas ansiedades. Ele oferece uma visão de um mundo que eles desejam recuperar, onde seus privilégios não são questionados. Essa promessa de restaurar a glória passada ressoa profundamente com aqueles que se sentem desamparados. A retórica de Trump se torna um reflexo de suas frustrações, e ele se posiciona como o salvador que devolverá a dignidade e o orgulho aos cidadãos americanos.
Por fim, é crucial reconhecer que a luta de Trump e da extrema direita é fútil. As minorias não desaparecerão, e a diversidade não será eliminada por discursos de ódio. Embora suas palavras possam amplificar a violência e a discriminação, elas não podem apagar a realidade da coexistência. O discurso de posse de Trump destaca a necessidade urgente de revitalizar o espaço público e a democracia. Enquanto isso não acontecer, o descontentamento com a democracia liberal continuará a oferecer oportunidades para aqueles que desejam miná-la de dentro.